A Crônica #002 – As noites mágicas

Brasileiros fizeram o que tinha que ser feito nas noites decisivas continentais

Hulk, Rossi e Veiga

Durante a semana, o técnico Abel Ferreira prometeu uma “noite mágica” em São Paulo, certo de que o Palmeiras remontaria os 3 a 0 sofridos para a LDU no Equador. Ainda, usou licença poética e parafraseou Carlo Ancelotti nos tempos de Real Madrid: “90 minutos no Allianz Parque é tempo demais”.

Se há paralelo entre Libertadores e Champions, Palmeiras e Real Madrid, ninguém pode dizer, mas que a missão era bem possível, isso era. Não fosse a altitude de Quito, jamais o time de Abel penaria para este adversário, frágil tecnicamente, embora bem treinado por Tiago Nunes (quer apostar quanto que volta para o Brasil?).

E se o Palmeiras tinha que encher a sacola de gols, como o Flamengo não fez na semana passada por méritos (e sorte) do Racing, o rubro-negro deveria suportar a pressão na casa adversária, como o alviverde não fez. Não havia altitude em Avellaneda, mas o ambiente mais hostil já registrado na Libertadores da era Disney.

Em tempo: quem não se arrepiou com a festa da hinchada da Academia (como é conhecido o Racing) e a expressão de criança maravilhada de seu técnico, ídolo e torcedor Gustavo Costas ao olhar para os céus, pode fazer uma boa reflexão se futebol é mesmo o seu negócio.

No campo, se a torcida argentina esquentou, o Flamengo tratou de esfriar, ficando com a bola, trocando passes, mostrando quem era superior. Não é à toa que tanta gente diz que nada se sobrepõe à técnica.

Rossi fez uma defesaça num cabeceio pegando fogo, por volta dos 15 minutos. Antes e depois disso, só deu Mengo, que amadurecia o gol enquanto cozinhava o galo.

Por falar em Galo, o Atlético, este foi diferente do Palmeiras ao conseguir segurar a barra na altitude de Quito. Foi vazado uma vez só pelo Independiente Del Valle e ainda beliscou o empate no fim, pela Sul-Americana. Foi igual ao Palmeiras ao mostrar dentro de casa, na semana seguinte, o quanto é superior.

Com Arena MRV lotada e clima de magia, o time mineiro marretou sem dó até que furou a retranca equatoriana, duas vezes: Arana e Dudu. O Porco, no Palestra, fazia o mesmo antes do intervalo, Sosa e Bruno Fuchs. O Flamengo desceu o túnel de El Cilindro com placar zerado.

Em Minas e na Argentina, não se precisava mais gols. Em São Paulo, faltavam dois. Dois vira, quatro acaba.

Bem postado na defesa, o Flamengo fez o time lá não muito criativo do Racing apelar à estratégia antiga de ataque: a chuveirada. Foi tanto chuveiro na área de Rossi que os Léos da zaga, Pereira e Ortiz, saíram encharcados – mas sem deixar vazar nada.

E quem estava mais tranquilo foi quem passou sufoco, o Atlético. Éverson bateu roupa após um chute venenoso e Spinelli conferiu: 2 a 1. Resultado perigoso!

A apreensão subiu na Arena do Galo, com a torcida temendo ver escapar a vaga na decisão da Sul-Americana, competição para salvar a temporada mediana, e da qual o Del Valle buscava o tricampeonato, para se consolidar como Sevilla das Américas.

Sampaoli lançou a artilharia antiga para salvar a lavoura: sai Rony, entra Hulk. Na capital paulista, Abel fez o mesmo, colocando Raphael Veiga no jogo.

E se restava alguma dúvida de que a antigaria sempre salva tudo, Hulk, praticamente na primeira corrida em campo, disparou na cara do gol e anotou o 3 a 1 que matava o jogo e a classificação. Gol 499 dele na carreira, 131 vestindo alvinegro.

Veiga recebeu passe primoroso de Vitor Roque e, também frente a frente com o goleiro, não moscou, 3 a 0 Palmeiras, botando fogo no (Allianz) parque. Depois disso, o quarto gol já era até redundância, e veio instantes depois, em pênalti que o ensaboado Allan sofreu após pintar o sete pela direita. 

Quem bateu? Veiga, é claro. Artilheiro isolado da nova casa verde, com 57 bolas na rede. E a mágica estava feita.

Atlético e Palmeiras fizeram a lição de casa e confirmaram que, se altitude, desgaste, distância contam, nada pesa mais que a técnica. E falo disso para lembrar que, lá em Avellaneda, enquanto isso, o Flamengo segura a barra dos argentinos, já com um a menos, após perder Plata.

O Racing pressionava, sim, mas bola na direção da meta, pouca coisa. E quando ia, Rossi estava lá para evitar ter que salvar a pátria de novo nos pênaltis, como já foi na fase anterior, contra o Estudiantes. Foi nesta toada até o apito final. Missão cumprida, e fim da magia argentina!

Quem tinha que fazer gols, fez, quem tinha de não sofrê-los, também o fez. E os três brasileiros estão nas decisões continentais.

O Atlético vai encarar o Lanús, em Assunção, dia 22 de novembro, podendo repetir o filme de 1997, quando já botou o time argentino de vice na Copa Conmebol, a antiga equivalente à Copa Sul-Americana. Além disso, venceu sobre os granate a Recopa 2014. Será que vem mais freguesia?

Já no dia 29, Flamengo e Palmeiras, os grandalhões do país e do continente, vão medir forças na final brasileiríssima da Libertadores, que, aliás, pode (e deve) ser no Brasil, na capital federal, fugindo do caos político de Lima, sede original.

O primeiro brasileiro tetracampeão da desejada sairá, e pode ser em solo nacional. E viva o Brasil!

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