FALSO-PONTA

Em 1967, Telê começava sua carreira de treinador nos juniores do Fluminense. Ele morava na Vila da Penha e tinha uma sorveteria. Um dos seus empregados era um jovem vizinho, Vanderlei Luxemburgo. Vinte e sete anos depois, eram os técnicos dos melhores times do mundo.

Sorveteria Tele Santana

No ano seguinte, Luxemburgo começava sua carreira de jogador nos juniores do Botafogo. Ele era um “falso-ponta”. Desde os anos 50, o futebol brasileiro recuava um ponta para se juntar aos dois médios e ao ponta-de-lança e formar um quadrado assimétrico com e sem a bola.

O Botafogo já jogava com o falso-ponta desde a época de Quarentinha, mas foi Zagallo que eternizou essa função no clube. Quando Luxa chega nos juniores, Zagallo é o técnico do profissional e Paulo César Caju é o encarregado dessa nobre função.

Campinho 58

Logo depois, Luxa se transforma em lateral-esquerdo. Como Zagallo e Luxa, a carreira de Telê Santana também esteve ligada à função de falso-ponta, por onde jogou a maior parte do tempo pelo Fluminense. Diferente de Zagallo, Telê era um falso-ponta pela direita.

O falso-ponta era a função que melhor expressava a cultura brasileira na tática. Era ele que fundava as diagonais defensivas e ofensivas, gerava assimetrias, criava superioridade numérica no setor da bola, ligava os setores, dava pausa, e organizava o time sem a bola.

A partir dos anos 80, o nosso “4231” assimétrico com pontas no estilo de Rivellino (falso-ponta) ou Jairzinho (segundo atacante) se transformava em 4312 ou 4222. O falso-ponta se transformou em “terceiro homem de meio-campo”.

O 3º homem de meio eram figuras como Júnior na seleção de 86, Zinho no Flamengo de 87 ou Palmeiras de Luxa, Ricardinho no Corinthians, etc. Eram os herdeiros do antigo falso-ponta, pois organizavam o time, ligavam os setores, produziam superioridade, diagonais, assimetrias, etc.

Campinho Seleção 86

No Fluminense de 2001, dirigido por Oswaldo de Oliveira, Diniz era o terceiro homem de meio-campo, o herdeiro do falso-ponta. Marcão era o 1º volante, Sidney era o 2º, e Diniz era o 3º homem de meio. Roger era o meia-atacante. Caio e Magno Alves, a dupla de ataque.

Fluminense 2001

Telê, Zagallo, Luxa e Diniz fazem parte de uma linhagem que pertence também à esfera da cultura e da sociedade brasileira. Eles foram intérpretes de uma função que exigia consciência dos companheiros, reflexão dos movimentos, e compensações.

Eles eram os organizadores do carnaval com a bola no pé. Com essa consciência, possibilitavam a construção de uma equipe com flexibilidade, assimetrias, diagonais, e um espaço farto para os movimentos. Possibilitavam que a bola fosse nosso sentido. Como técnicos, refletem isso.

A Vila da Penha foi palco do encontro de Telê e Luxemburgo, de vários artífices do nosso jogo, de gênios como Romário, Dinamite e Carlos Alberto Torres. O subúrbio carioca foi paisagem e espaço criador das marcas do povo brasileiro no jogo. Na tática, inclusive.

Romário futvolei

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