Dois dias após o Fluminense se classificar para a final da Libertadores, voltando do trabalho, encontrei meu melhor amigo, Gian, no metrô. Eu, flamenguista, ele, tricolor. Ambos por influência de nossas famílias. Gian, torcedor do Fluminense por causa do avô, falou empolgado como poucas vezes vi sobre o time. Ele sempre foi um cara sério, de poucas palavras, mas que se solta e abre um sorrisão quando fala de algo que o encanta muito. Sobre futebol, eu não o via falar com essa empolgação desde 2008, ano do vice da Libertadores.
O momento me deixou feliz, não só por esbarrar com meu amigo, mas por ver no semblante dele uma empolgação com o time que eu, por anos, achei que nunca mais veria. Em 2008, ele foi a todos os jogos da campanha com o avô. Choraram, se empolgaram e sofreram com a derrota para a LDU. Hoje, com seu avô já falecido, Gian acompanha o Fluminense não tão bem acompanhado, mas ainda com a memória de seu avô consigo.
Escrevo esse texto pela certeza de que o futebol evoca uma força nostálgica que nem o cinema ou a música conseguem trazer. O Gian que eu vi comentar sobre o gol de John Kennedy não era o meu amigo de 30 anos de idade, mas o menino de 16 que sonhava com o inédito. Assim como eu, ele é apaixonado por filmes, música, jogos e várias outras artes, mas em 24 anos de amizade, nunca vi algo evocar tanto sua infância quanto a virada sobre o Internacional no Beira Rio.
E não é para menos, o jogo me deixou um gosto de eternidade raro no futebol de hoje. Há jogos aos quais assistimos e sentimos que cada segundo é uma vida, cada minuto é um filme, e cada movimento em campo traz consigo um universo de possibilidades. O que senti vendo a virada do Fluminense se assemelha ao que senti vendo a vitória do meu time sobre o River Plate na final de 2019. Foi o que senti vendo Messi flutuar em campo na final da Copa do Mundo de 2022. Não era uma final, mas fica aquele sentimento de que é o jogo que define a eternidade daquelas pessoas.
Nem sempre um time precisa ser campeão para marcar uma geração. O Brasil de 1982 é, sem dúvidas, um dos mais encantadores times que já tive o prazer de ver (pela internet, claro, pois sequer era nascido). O tamanho do feito de um time não se mede pela taça, e sim pela força com que ele engaja quem o testemunha. Um título pode ser, sim, sem graça, assim como uma trágica derrota pode ser, sim, bela e eterna.
Independente do que aconteça no dia 4 de novembro, quando o Fluminense decidirá o título no Maracanã com o Boca Juniors, eu tenho certeza de que André, Cano, Ganso, Marcelo, Nino, Fábio e cia já marcaram a história. O Fluminense de Fernando Diniz já é, sim, um time eterno; já mexeu com a alma dos torcedores e conquistou seu lugar na história. Mesmo que a taça não venha – e espero, de verdade, que venha –, eu já fico satisfeito simplesmente por ter colocado no rosto do meu amigo um sorriso que há muito tempo não via.
Retornando a citar a seleção de Telê de 82, aproveito para deixar a questão: se um time protagoniza uma das campanhas mais épicas da história de uma competição, com um futebol que representa suas raízes, suas paixões e sua mitologia, do que vale uma taça diante disso? Eu jamais abriria mão de minha identidade em troca de um título. No fim das contas, vencer representando milhões é mais gostoso do que vencer apenas por vencer, sem emocionar, sem mobilizar. Futebol é, antes de tudo, um fenômeno social. E nisso, o Fluminense de 2023 já é vencedor. Porque se você vence sem comover, afinal, pra quê serve a taça? O que é, de fato, vencer, se não fazer um homem de 30 anos sorrir como um adolescente de 16?
Pelo meu amigo, pela memória de seu avô, pelos meus outros amados tricolores André, Sara, Bernardo, Diogo e tantos outros. Pelos milhões de tricolores e por todos os apreciadores do bom futebol, vença a Libertadores, Fluminense. Mas se não, a emoção que você proporcionou no caminho certamente já marcou as nossas vidas.