POR QUE AMÁVAMOS ASSISTIR A MARADONA?

Baixinho, gordinho, pouco atlético, mas quando encostava na bola colocava até os defuntos em vigília pelo que ocorreria. Os minutos sem Maradona eram de ansiedade por Maradona. E os minutos com Maradona eram de atenção e espanto.

Maradona

Todos os jogadores de futebol são colocados diante de um dilema quando a bola chega aos seus pés: o que fazer? Passar, dominar e passar, dominar e tentar uma jogada individual? Segurança ou risco? Sempre que a bola chegava em Maradona, ele optava pelo risco.

Maradona assumia a bola como um íntimo, um amante, e um novo ardil era inventado. A solução não se repetia. Elas eram únicas para cada lance porque refletiam o sentimento, a antevisão, a intuição, a precisão daquele instante.

Faz-se evidente que todos os jogadores tentam fazer o melhor possível e que ninguém deseja errar. Contudo, a vida ensina que assumir riscos implica maiores chances de erro como também de resultados mais impactantes. Maradona assumia o risco sem medo.

Na icônica Copa de 1986, Maradona foi o símbolo. Melhor jogador, mais participação em gols (5 gols, 5 assistências), mais dribles por jogo, mais passes decisivos, mas também o segundo jogador que mais perdeu bolas em toda competição (21,7 por jogo). Todos se lembram dos imortais gols de Diego contra a Inglaterra ou a Bélgica; contudo, para conseguir esse feito, Maradona tentou e errou muito antes. Foram mais de 20 bolas perdidas por jogo. Tentava, errava, insistia, não parava, ia ganhando ritmo.

Maradona x Belgica

Muitos treinadores contemporâneos possuem alergia ao risco. Eles acreditam que é mais efetivo um jogador que siga os protocolos, saiba manusear os mecanismos da equipe, jogue rápido e de primeira, execute decisões programadas, perca menos a posse da bola. Menos riscos, menos erros.

Grealish era o centro das atenções no Aston Villa. Tudo passava por seu pé e ele tinha autonomia para se movimentar por todo o campo, segurar a bola, conduzir, arriscar. No City, ele teve que se adaptar. Optar por mais segurança para perder menos a bola.

A maioria dos treinadores optam por menos risco. Para Vini Jr. foi bendição a chegada de Ancelotti no Real Madrid. O brasileiro foi disparado o jogador com mais dribles em 22/23, mas também o com mais perdas de posse. Ancelotti dá liberdade para o brasileiro arriscar.

Vini e Ancelotti

Os treinadores estão preocupados com a vitória, mas boa parte da nobreza do futebol está no desprendimento em arriscar. O futebol nunca teria se tornado o esporte mais interessante no mundo sem jogadores com o perfil de Maradona e Vinicius.

O mundo para em atenção por um jogador que arrisque um drible, um passe difícil, que anteveja uma jogada antes de todo estádio, que assuma riscos e faça algo fora do banal.

Uma partida de futebol ocorre num ritmo entre a repetição de coisas extremamente banais até que o extraordinário acontece. E é esse extraordinário que entra em nosso imaginário, capta a nossa atenção, cria admiração e espanto, e fomenta os ídolos.

Maradona é essa síntese. De jogadores que dão o seu melhor, buscam acertar, mas que aceitam a imensidão da vida. Correm riscos e não se pertubam com os erros. Para se tornar mais interessante, o futebol contemporâneo precisa de mais impetuosos, dos que aceitam o drama da vida.

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